23.9.18

La loba


Eu quero que vá para o diabo qualquer pessoa que um dia teve a audácia de dizer que eu não posso ser quem eu sou, que ousou me julgar, quem se achou importante a ponto de interferir nas minhas vontades. Se for pra ser justa, que eu tenha também o mesmo destino que todos esses por simplesmente permitir acreditar que eu era menos, que eu era o ontem, que eu podia ser limitada e me limitar.

Eu passei tanto tempo achando que não sabia voar, esperando que alguém me empurrasse do ninho. Que me dissesse que tava tudo bem e eu me acostumei a ficar ali, a altura me assustava e o medo era tudo o que eu tinha. E ele foi quem eu fui muito tempo pra satisfazer uma medula que nunca foi minha. Na verdade, eu nem sabia se tinha isso dentro de mim, eu nunca parei pra olhar.

Há algum tempo eu libertei algumas partes aprisionadas, quando me livrei de cada fio liso da minha cabeça, mas ainda haviam muitas vozes presas. Muitos 'não' que não foram ditos, muitos incômodos guardados pelo receio de não agradar, de não encaixar, muita dor sentida que não era minha. Muito dos outros e pouco de mim. Muito deles e nada meu. Eu deixei que tomassem, hasteassem e demarcassem território.

Hoje eu chorei o choro mais profundo da minha vida, o mais verdadeiro e o mais dolorido. As lágrimas borraram meus olhos, escorreram até no meu peito nu e ali alimentaram uma semente a tempo esperando ser semeada. 
- Eu estou tomando o controle da minha vida, eu falei algumas vezes. 
Firme, me encarei. Não aceito mais colonização. Cada um tome o direito sobre suas próprias aflições porque eu só cuidarei das minhas. Que venha o buraco, mas que seja meu e eu tenha o direito de descobrir o que fazer com ele. Chega de cobrir com as prioridades de outrem. Basta!

Eu gritei enquanto me banhava. Lavava o braço e saia barulho fino, esfregava a barriga e uivava o mais alto que eu pudesse. Às vezes abafado, às vezes forte, às vezes agudo. Apenas alguns que colecionava dentro de uma alma desesperada por voz. Muitos ainda precisam sair, eu sei, mas iniciei a minha jornada em busca da minha essência, tantas vezes mascarada e negligenciada. Eu assumirei, acolherei a minha culpa e me libertei dela. Purificação.

Talvez eu descubra que minhas asas não estão presas e talvez eu descubra que eu nem as tenho
tudo bem, ser pássaro não é a única opção existe para a liberdade, afinal
De repente a minha liberdade é ser loba. Por vezes sou alcateia e por vezes sou solitária
e como toda boa loba eu quero uivar
e sentir os pelos voando e encontrando a folhagem num lindo campo 
e quero caçar, rasgar a pele, ver o sangue, me alimentar
ser instinto

Que eu vá para o inferno, mas eu volto.
Porque eu cansei de ser só a chapezinho vermelho.

Nenhum comentário:

Postar um comentário